quarta-feira, 31 de julho de 2013

Superpreocupante

Reportagem “Quanto custa um país”, da revista Superinteressante, revela um cenário muito difícil para o futuro do Brasil.

O Brasil melhora! Contente-se, mas preocupe-se com o amanhã. No mesmo dia (30 de julho de 2013) em que se divulga que Índice de Desenvolvimento Humano dos municípios brasileiros subiu 47,5% - e vai de 'muito baixo' para 'alto' em duas décadas, em longevidade da população e renda, mas quase 30% das cidades brasileiras têm nota considerada "muito baixa" em educação -, o noticiário destaca fatos assim:

Expansão do PIB segue em 2,28% (O Estado de S. Paulo).

Vendas de shoppings desaceleram (Valor Econômico).

Sobrepreço de R$ 2 bilhões na refinaria - Segundo o TCU, obra em Suape incluiu serviços não previstos originalmente por causa de erros cometidos pela Petrobras. (Jornal do Commercio-PE)

Fortuna de famílias ricas é, na média, de R$ 9,4 milhões.  Existem no Brasil 5.732 famílias ricas (na média, menos de 1 por município, calculo) que investem seus recursos por meio dos gestores de patrimônio. (Há outras alternativas, acrescento.) (Valor Econômico)

Surto de diarréia - Além do Sertão, cidades da Zona da Mata estão sofrendo por conta da má qualidade da água. (Jornal do Commercio-PE)

Plástico ou cimento? Surubim, município de 60 mil habitantes no interior de Pernambuco, começou a receber nos últimos dois meses 1.300 cisternas de polietileno, doadas pelo Ministério da Integração Nacional no âmbito do programa Água para Todos. Muitas estão armazenadas no campo de futebol da cidade. (O uso de cimento está em debate.)(Valor Econômico).

Paulista ganha 21 vezes mais que maranhense (O Estado de S. Paulo).

Falta de regra deixa R$ 18 bilhões de elétrica sem dono. Patrimônio hoje não está mais no balanço das companhias nem da União. (Brasil Econômico).

Ônibus caro: Tarifa acima da inflação no Interior. Em 10 anos, nove maiores cidades fora da Grande Porto Alegre tiveram aumento médio de 105,29%. (Zero Hora-RS)

Fila de banco - O Tribunal Regional Federal da 1ª Região reverteu decisão de primeira instância e considerou constitucional lei municipal de Manaus que estipula tempo máximo 45 minutos de espera dos clientes para atendimento em bancos. (Valor Econômico).

Que falta faz uma escola padrão Fifa – Educação é o  único quesito que ainda não atingiu um patamar considerado alto, apesar de registrar a maior evolução do período (128%). Puxada, vale ressaltar, por mais matrículas, o que não significa um ensino melhor. (Correio Braziliense).

No Brasil, o sistema educacional investe apenas US$ 2.900 por aluno. É três vezes menos que o Reino Unido, e seis vezes menos que os Estados Unidos, segundo a revista Superinteressante de agosto.

Na Folha de S. Paulo, Eliane Cantanhêde escreve que o IDHM confirma que o Brasil, mesmo que aos trancos e barrancos, vai no bom caminho. (...) “O carioca Fernando Henrique e o pernambucano Lula saíram para o Planalto e para mudar a cara do país. Um porque combateu a inflação, elevou o patamar internacional do país, botou a casa em ordem na economia e deu o "start" em programas sociais cruciais. O outro porque manteve uma política macroeconômica saudável e transformou o grande momento mundial em oportunidade para uma inclusão social histórica. (...) Há muito ainda a fazer, principalmente na educação. O último lugar em desenvolvimento humano foi Melgaço (PA), onde metade da população não sabe ler nem escrever. Enquanto houver "Melgaços" no Brasil, gritemos. Oba-oba os governantes já fazem à exaustão”. 

EXPANSÃO DO PIB MINGUA

Na véspera da divulgação do IDHM, o editor de Economia do Correio Braziliense, Vicente Nunes, escreve, na coluna Brasil S. A., “de que adiantará levar adiante a onda de desconfiança (com a equipe econômica) que vai impor ao país o terceiro ano consecutivo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) inferior a 2%?”.

(O PIB é o resultado de tudo o que o país produz, acrescento.)

“Economistas como Tony Volpon, da Nomura Securities, apostam que, na melhor das hipóteses, a expansão da atividade neste ano será de 1,6%. Nilson Teixeira, do Credit Suisse, fala em 2%, mas com viés de baixa. Não se pode esquecer que, em 2012, quando o mesmo Teixeira falou que o PIB avançaria 1,5%, Mantega classificou a projeção como piada. O resultado foi ainda pior: 0,9%”, acrescenta Nunes.

SOMOS POBRES

Por que é superpreocupante?

A Superinteressante, edição de agosto, na reportagem “Quanto custa um país”, de Andreas Müller, Ricardo Lacerda e Bruno Garattoni, editada por Bruno, escreve que o Brasil é o país dos impostos. “E da corrupção. Os políticos roubam muito, e por isso os serviços públicos são ruins. Tudo isso é verdade. Mas não é toda verdade”

O governo, segundo o texto e o infográfico do design Jorge Oliveira, arrecada pouco. “São US$ 4.085 por habitante, por ano – é o que tem para gastar com todos os serviços públicos prestados a cada pessoa. (...) Hospitais, universidades, escolas, polícia, cadeias, tribunais, ruas, estradas, portos, investimentos...

(...) US$ 4.085 (número em dólar, já corrigido pela paridade do poder de compra) parece bastante, só que não é. Países desenvolvidos arrecadam pelo menos o triplo de dinheiro por habitante (os Estados Unidos, US$ 13.429 por ano). Suécia e Noruega arrecadam até cinco vezes mais que o Brasil. Até países subdesenvolvidos, como Argentina e México, arrecadam mais dinheiro do que nós”, escreve a revista.

O Brasil é a sétima economia do planeta. Só que essa produção, segundo a Superinteressante, é dividida por um país com 197,4 milhões de pessoas, a quinta maior população do mundo. “Nosso PIB per capita é de apenas US$ 11,8 mil por habitante, o que nos dá o nada honroso 74° lugar no ranking mundial”.

Margarida Sarmiento Gutierrez, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em finanças públicas, afirma que o Brasil tem um desempenho de país pobre. “Isso significa que, para cada indivíduo que paga muito imposto sobre salário e sobre os produtos que consome, há um monte de pessoas que pagam pouco – porque ganham pouco e consomem pouco. O problema é que o salário médio de contratação, segundo dados do Ministério do Trabalho, é de R$ 1.011. Renda de país pobre, que gera arrecadação de país pobre – e serviços de país pobre. Para piorar, os ricos também pagam pouco imposto”, diz na reportagem.

SOLUÇÕES DIFÍCEIS

Superinteressante propõe quatro soluções. A primeira é acelerar o crescimento da economia. “Se o Brasil dobrar seu PIB per capita (US$ 11,8 mil), dobrará o dinheiro disponível para serviços públicos. Ainda assim ficaríamos bem atrás dos países desenvolvidos, mas alcançaríamos a Coréia do Sul, um bom exemplo de país emergente. Para que isso aconteça, o Brasil precisaria crescer 4,7% ao ano durante os próximos 17 anos. Não é nada de outro mundo. A China, por exemplo, conseguiu crescer em média 9,5% ao ano durante 24 anos seguidos”.

(Recordo que o Brasil poderá ter, em 2013, o terceiro ano consecutivo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) inferior a 2%.)

Outra saída proposta é a busca de novas fontes de energia. A maior delas é o petróleo do pré-sal. “Somando royalties e outras compensações, ele deverá render até R$ 108 bilhões ao governo federal e R$ 171 bilhões para Estados e municípios.

(Todo potencial do pré-sal precisa ainda ser explorado, ressalvo eu. No mais, é torcer, segundo o engenheiro e consultor Humberto Viana Guimarães, para que os campos leiloados na 11ª Rodada (14/05/13) comecem a produzir o mais rápido possível e que o pré-sal torne-se realidade, para que em 2028 possamos, por fim, comemorar sem factóides e ufanismos eleitoreiros, a tão sonhada autossuficiência na produção de petróleo”).

A terceira proposta seria aumentar a tributação. “Se quisésssemos ter mais investimento público, teríamos de aumentar mais ainda a carga tributária”, afirma o economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas. Superinteressante escreve que a equação é complexa, mas há pistas de como solucioná-la. “No Brasil, 45% da arrecadação tributária vem de impostos cobrados sobre as coisas que consumimos. Nos países ricos, a média é 29%. Conclusão: nós taxamos demais nossos produtos”.

“Os tributos que incidem sobre o consumo são os mesmos para pessoas ricas e pobres”, diz João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBTP). Uma possível saída é reduzir essas taxas, e compensá-las criando alíquotas mais altas de imposto de renda – a máxima, no Brasil, é de 27,5%, “um valor extremamente baixo pelos padrões internacionais”. Praticamente todos os países têm alíquotas mais altas que incidem sobre o cidadão de maior renda. (Estados Unidos, Chile e África do Sul, entre 35% e 40%.)

A quarta iniciativa seria usar o dinheiro de impostos de maneira mais inteligente - e mais honesta, propõe a Superinteressante. A começar pelo dinheiro que o governo gasta consigo mesmo. “Se o Congresso reduzisse seus gastos para o mesmo nível do México, seria possível economizar R$ 7,3 bilhões por ano – muito mais do que está sendo gasto com todos os estádios da Copa do Mundo”.

Isso sem falar na corrupção. Um levantamento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo estima que, a cada ano, o Brasil perca pelo menos R$ 41,5 bilhões por causa dela. (...) “Somos “apenas” o 69° no ranking das 180 nações mais corruptas do mundo”. (...) Estudo do Banco Mundial aponta o Brasil como o vice-campeão em sonegação (US$ 280 bilhões, quase o dobro de tudo o que entra via imposto de renda, por exemplo.) Com o dinheiro da sonegação, seria possível quintuplicar os gastos federais em saúde e educação.

DIFICULDADES

Superinteressante conclui que é muito difícil, ou impossível, acabar com a sonegação. “Também é muito difícil fazer o país crescer 4,7% ao ano por 17 anos. É muito difícil matar a corrupção. É muito difícil aumentar os impostos dos ricos – ou convencer os congressistas a reduzir seus próprios salários. Tudo isso é muito difícil. Mas fazer uma combinação dessas coisas, aplicando um pouco de cada remédio, talvez não seja tão difícil assim”.

A reportagem da Superinteressante, edição 321, de agosto, ocupa seis páginas.

José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.

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